23 de ago. de 2011

As três chamas do Amor




Bem no meio da Bíblia há uma coleção de poemas de amor hebraico muito explícito, que jovens judeus não têm permissão de ler, até terem mais idade. O Cântico dos Cânticos, ou Cantares, nos dá uma série de imagens, do relacionamento de homem e mulher. A alegria, o conflito, a perplexidade. É como se o amor que esse casal explora, tivesse uma vida própria.

A mulher diz várias vezes: “Não acordeis nem desperteis o amor até que ele o queira.” É como se ela dissesse, “Seja o que for é tão bom, é tão lindo, como se não pudéssemos fazer nada pra estragá-lo.” Nós usamos e abusamos da palavra “amor”. Não é? Nós dizemos que amamos uma pessoa, e logo depois falamos de como amamos um carro novo, ou certo par de calçado. Afinal, eu amo minha esposa. E eu também amo chocolate? Mas temos que lembrar que o Cântico dos Cânticos foi escrito originalmente em hebraico, e em hebraico há três palavras que correspondam ao nosso “amor”. 


A primeira é a palavra “Raya”. “Raya” se traduz literalmente como “amigo” ou “companheiro”, alguém que lhe faz companhia. Pode até ser traduzido como o termo “alma gêmea”. As pessoas falam disso o tempo todo. E dizem coisas como: “Ela é minha melhor amiga” ou “Posso contar tudo pra ele”. Estas são expressões de “Raya”. Então vemos que no núcleo da relação entre esses amantes há uma amizade. 


Outra palavra hebraica usada para “amor” é “Ahava”. “Ahava” é um afeto profundo, o desejo de estar tanto com alguém, que dói no seu coração. “Ahava” é quando sua mente e seu coração se voltam para seu amante com tal intensidade que você não pensa em mais nada. Minha esposa e eu fomos amigos por quatro anos, quatro anos de “Raya”, antes que algo mais acontecesse. Eu morava em Los Angeles, e ela veio me visitar num fim de semana. Nós saímos pela primeira vez. Havia uma sensação de expectativa no ar, devido a nossa curiosidade. Saber, “Será que há ‘ahava’ para complementar nosso ‘Raya’?” Lembro-me de estarmos sentados no restaurante, alguns quarteirões do oceano. E senti a sensação de que eu preferia estar ali com ela naquele momento, a estar em qualquer outro lugar do universo. 


Os amantes afirmam no Cântico dos Cânticos, que “ahava” é forte como morte, que muitas águas não podem apagar o “ahava”. “Ahava” é o amor da determinação. É muito mais profundo que sentimentos românticos fugazes. É muito mais que anseios temporários. “Ahava é tomar a decisão de unir a sua vida a de outro. Essa é uma emoção que leva ao compromisso, que leva unir a sua vida, a vida de outra pessoa. “Ahava” é o que faz tudo perdurar. Se pensarmos em amor como tipos de chama, primeiro tivemos a chama do amor “Raya”. É como a amizade, o aspecto da alma gêmea na relação.Uma chama de tamanho “pequeno”, em comparação. Depois vem a chama do “ahava”, que é a chama do compromisso e da decisão de unir suas vidas. Uma chama do tamanho “médio”. 


Mas há uma terceira palavra hebraica para amor no Cântico dos Cânticos. É a palavra “Dod”. “Dod” pode ser traduzido literalmente como “ farrear, abalar, ou ameigar”. Creio que entendam o conceito desta chama. É usada em várias partes das Escrituras. Em provérbios esta escrito: “Vem, saciemo-nos de amores até pela manhã.” “Dod” é o relacionamento físico e sexual de um relacionamento para o casamento. Então temos a nossa chama de “Raya” “pequena”, temos a chama do “Ahava”, “média” e temos a chama de “Dod” “grande”. E no encontro do homem e da mulher no casamento, todas as chamas são combinadas, elas devem estar juntas. Jesus fala dessa idéia de seres se encontrando. Ele usa o termo “uma só carne” e um só coração, para descrever essa conexão entre homem e mulher. Essa carne é muito mais que um simples contato físico. É emoção. São os corações. São as mentes e experiências. É a mistura das almas. Então esta união física torna-se uma imagem única e de profunda realidade espiritual. Jesus nos ensina que o sexo é um ato espiritual, e que algo tão lindo, algo tão poderoso, destina-se a perdurar para sempre. Sabe-se que uma chama queimando solitária, nunca será tão quente quanto todas as chamas juntas. Afinal, fomos criados para queimar todas as chamas juntas. E pense em todas as formas em que estragamos isso. 


Por exemplo, pense em um caso amoroso. Pessoas compartilhando da chama do “Dod”, mas sem as outras chamas, sem o “Raya” nem o “Ahava”. Não há amizade, não há compromisso, não há lealdade e nem sacrifício. Pode haver o “Dod” mas não há “Raya” nem “Ahava”. São duas pessoas tentando, só com a chama de “Dod”, conseguir todo calor das três chamas juntas. Não me surpreende que a pessoa sinta-se vazia e insatisfeita. Fomos criados para muito mais. Então a pessoa retorna para essa única chama repetidamente, sem nunca ficar satisfeita. Não da pra ser feliz assim. E que tal um casal que está casado há anos, e ainda estão juntos, ainda há compromisso, ainda há um certo “Ahava”, mas honestamente, não há nada mais? Não há amizade. Não há sexo. Eles negligenciam as chamas que finalmente tremeluzem e enfraquecem, até apagar. 


Ao separar as chamas, nunca se alcança a satisfação. É como viver fora do plano que Deus criou para sua vida. 


Talvez a nossa cultura não tenha idéia do que é a verdadeira sexualidade. Talvez o mundo ao nosso redor, no que se trata de sexo, esteja completamente por fora. Afinal, a verdadeira sexualidade é vasta e misteriosa. É espiritual e envolve você como um todo. Você em corpo também tem alma e espírito. Amor é o encontro das almas e dando tudo de si para o outro. E agora: que você honre a maneira como Deus o criou. Que você tenha respeito profundo pelo fato de ser um ente profundamente espiritual e misterioso, e de que Amor é no fundo algo extremamente Espiritual. 


Que você descubra que as três chamas foram feitas para queimar juntas. E que você descubra... a chama maior, a Chama do Amor Ágape.


Rob Bell